sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

eu tentanto escrever uma história (ainda sem final)

"Mais um começo de semana... mais um dia comum... acordar cedo ainda era uma tortura... Segunda-feira chuvosa, ninguém merece levantar tão cedo...
5 da madrugada, crianças dormindo, preparo café da manhã, leite com chocolate para as crianças, café bem forte pra mim... torradinhas com os pães que sobraram de ontem e algumas bolachas recheadas.
Poderia fazer tudo isso, todo dia, dormindo... sabia de cor meus passos, não que eu não fosse feliz, pelo contrário, levava uma vida tranqüila.
Naquela manhã as crianças demoraram um pouco mais para acordar e eu permiti, estava um tempo perfeito para ficar mais 5 minutinhos na cama.
Tomei meu café silenciosamente pensando em como minha vida não poderia ser mais tediosa.
Ah que ótimo as crianças levantaram... Banheiro molhado do banho, brigas no café da manhã, uniforme sujos de geléia de morango... brigas no carro, choro e discussão... beijinhos, boa aula.
Dirigo calmamente até o centro da cidade, trabalho numa clínica médica, mesmos pacientes de uma cidade pequena.
A Dra Ane chegara cedo. Seu carro já estava no estacionamento, a chuva diminuía lentamente.
O dia correu normalmente, nada de muita novidade, alguns pacientes gripados e outros que iam na clínica já por costume, como se fosse uma padaria e todo dia tivesse que ir comprar um pãozinho.
A Dra Ane era uma senhora sistemática, carrancuda as vezes, mesmo assim a maioria dos pacientes da cidade recorriam ao seu consultório. Uma ótima profissional com certeza. Não tinha filhos, morava sozinha em uma cidade vizinha. Tinha medo de morar na cidade e sua casa virar um hospital mas também não podia morar tão longe, caso algo ruim acontecesse.
Eu a conheci no último ano de administração, eu estagiava no Hospital da cidade, onde ganhava menos do que auxiliar do assistente de enfermaria. Ela tinha acabado de chegar na cidade e tinha planos de construir seu império clínico ali.
Não gostei dela de cara e ela menos de mim, mas algo dizia que minha vida profissional não sobreviveria se eu não agisse rápido, ela era minha única chance.
A entrevista foi um resumo da minha vida pessoal, ela pouco se interessou se eu estava formada, se eu gostava do que fazia, ou porquê tinha decidido trabalhar com ela... Não, ela queria saber como eu vivia e com quem eu vivia.
Não gostou de saber que eu tinha 2 crianças em casa, principalmente por não serem meus filhos. Mas me aceitou por eu não ter namorado, nem marido, nem nada parecido.
Disse que não admitiria homem atrás de mim na clinica, nem ligações pessoais.
Não sou psicóloga mas logo vi que ela deve ter sofrido muito com algum homem, ela era amarga e insensível.
No primeiro dia de trabalho me proibiu de usar anéis e brincos, nem maquiagem e me deu um avental bege bordado – Clinica Dr Ane.
Decidi não me importar, me arrumava por costume mas na verdade não tinha pra quem me arrumar.
Depois de quase 5 anos trabalhando com a Dra Ane, nossa relação não mudou muito. As vezes ela entrega alguma coisa pra dar as crianças, pergunta como elas estão. Tenta não ter muita intimidade, mas eu tinha conquistado sua confiança e era isso que fazia um pouco de diferença.
Eu entrava as 7:30h, tinha uma hora e meia de almoço, e saia as 19 horas. As crianças ficavam na creche o dia todo, mas não se incomodavam.
Mirela tinha 5 anos, deveria ter nascido menino. Anda, fala e até se gosta de se vestir como menino. Tem olhos grandes e pretos, a pele branca com sardas. Seu cabelo era avermelhado, curto. Ela decidiu que seria assim. Na primeira oportunidade cortou o cabelo inteiro, deixando alguns cachos pendurados ao ser surpreendida pela professora. Era forte, mesmo sendo mais nova que o irmão, sempre tinha vantagem nas brigas com ele. Era decidida e insistente como a mãe. Não havia ternura em seus olhos.
Dimas era mais velho um ano, tinha olhos claros, rosto pequeno e redondo. Era magro e demonstrava ser muito frágil, mas não era. Apesar de não ser tão forte como a irmã, a bravura não ficava atrás. Seu rosto de inocente enganava e ele sabia disso e aproveitava cada oportunidade pra mostrar quem realmente era.
Mesmo assim eram obedientes a mim, eram-me gratos. Não se mostravam culpados nem sentiam remorso por terem sido abandonados pelos pais.
Eu não era rude com eles, encobria as travessuras muitas vezes. Gostava deles, os amava na verdade.
Minha família já não existia mais, pelo menos não existia para nós. Tínhamos uns aos outros e isso era o que importava. Tínhamos nosso natal, nossa ceia de fim de ano, nossos passeios aos domingos. Éramos uma família.
Na vida toda, tive somente um homem, no começo da faculdade. Não era bonito, nem atraente. O que lhe salvava era sua inteligência. Era falante, risonho. Não sei o que viu em mim, mas se encantou. Ficamos o primeiro ano da faculdade juntos até ele perceber que não ia passar a vida dele cursando uma faculdade de Segunda, numa cidade no fim do mundo... ele ansiava por mais e tinha coragem para ir atrás. Nunca o amei de verdade, ele era pra mim um consolo, tinha por ele algum carinho mas não chorei sua partida.
Meu salário era razoável, tinha uma casa e um carro quitados. As crianças não freqüentavam a melhor escola, mas já liam e escreviam algumas palavras.
Nunca tivemos luxo, nunca nos permiti. Não queria engana-los ou incentiva-los a uma vida que não teríamos.
Eu cresci assim e o que a vida me ensinou de bom, passava para eles.
Aprendi a ler em casa, fui pra escola a primeira vez com 8 anos de idade, mas já lia e escrevia.
Meu pai morreu quando eu tinha 17 anos, herdei a casa. Minha irmã dois anos antes tinha fugido com o namorado, voltou 3 anos depois da morte de meu pai com o Dimas enrolado num cobertor velho. Disse pra mamãe que iria mudar, que ia ser outra pessoa. Mas durou uma semana e ela fugiu outra vez. Minha mãe foi costureira a vida toda, casou- se sem amor pra não ficar sozinha aos 39 anos e engravidou da minha irmã aos 42. Eu vim dois anos depois, nasci de 6 meses sem nenhuma chance de sobrevivência. Depois de quase 9 meses na uti do hospital, consegui ganhar quilos o suficiente para ir pra casa.
Meu pai era segurança e se orgulhava da profissão. Tinha sido casado antes de conhecer minha mãe, mas sua ex esposa não podia engravidar, por isso meu pai a abandonou.
Com mamãe não foi diferente depois de receber a notícia de ter 2 filhas e que mamãe não poderia mais engravidar, a rejeitou completamente.
Papai tinha a opinião de que homem de verdade era honrado quando tinha um filho, alguém pra seguir seus passos. Não aconteceu. Não abandonou minha mãe por já estar com quase 70 anos, saúde debilitada e não ter pra onde ir.
Ele morreu primeiro, não conheceu o neto... teria sido sua alegria final na vida. Mamãe recebia uma pensão até generosa e resolveu parar de costurar, logo adoeceu. Até o fim de sua vida ela jurava que não continuar a trabalhar tinha a matado.
No enterro da mamãe, Claúdia voltou, com cara de arrependida e mais um pacote enroladinho. Disse que seriamos agora só nós duas e tudo ia ser diferente. Depois de 2 meses, fugiu novamente e nunca mais voltou.
Até hoje acho que ela vai entrar pela varanda com mais uma criança nos braços.
Fui criada pela única parenta mais próxima. Uma meia irmã de meu pai. Na verdade ela não tinha ninguém, nem dinheiro mais pra pagar aluguel onde morava, a chance dela estava ali. Me assumiu e começou a receber a pensão de meu pai. Aos 15 anos tive que começar a trabalhar. As crianças cresciam e o dinheiro da pensão já não dava mais para nós 4. Arranjei emprego no mercadão da cidade, por caridade do dono que dizia ter gostado muito de meu pai. Não ganhava muito mas já era uma ajuda em casa.
Decidi que queria estudar, que não ia deixar meus sobrinhos crescer na miséria e também prometi que nunca ia abandona-los.
Com 19 anos passei no vestibular da Faculdade Publica mais perto da minha cidade, há quase 70 kilometros. Madrugava todo dia para ir pra escola, voltava correndo pra trabalhar no mercadão.
Os colegas da faculdade me ofereciam vagas em quartos para eu não precisar fazer essa viagem todos os dias, mas eu fazia questão, tinha feito uma promessa, não ia deixar os meus sobrinhos.
Quando comecei a namorar o Alberto, a situação melhorou um pouco pra mim, ele me levava em casa todos os dias e foi assim que eu aprendi a dirigir.
Ele era um homem bom, me incentivava e gostava do minha dedicação.
Quando foi embora, deixou o carro de presente, disse que era pouco para pessoa tão esforçada. Na verdade não queria ter nada dele, nada que me lembrasse ele, não por amor, mas pra não ficar relembrando e remoendo o passado, aceitei sem opção...................



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